quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

A prova documental do racismo no Brasil, em especial nos governos racistas do PSDB

PM dá ordem para abordar ‘negros e pardos’ Instrução de comandante de batalhão se baseou na descrição de vítima de assalto em bairro luxuoso Thaís Nunes thais.nunes@diariosp.com.br Desde o dia 21 de dezembro do ano passado, policiais militares do bairro Taquaral, um dos mais nobres de Campinas, cumprem a ordem de abordar “indivíduos em atitude suspeita, em especial os de cor parda e negra”. A orientação foi dada pelo oficial que chefia a companhia responsável pela região, mas o Comando da PM nega teor racista na determinação. O documento assinado pelo capitão Ubiratan de Carvalho Góes Beneducci orienta a tropa a agir com rigor, caso se depare com jovens de 18 a 25 anos, que estejam em grupos de três a cinco pessoas e tenham a pele escura. Essas seriam as características de um suposto grupo que comete assaltos a residências no bairro. A ordem do oficial foi motivada por uma carta de dois moradores. Um deles foi vítima de um roubo e descreveu os criminosos dessa maneira. Nenhum deles, entretanto, foi identificado pela Polícia Militar para que as abordagens fossem direcionadas nesse sentido. Para o frei Galvão, da Educafro, a ordem de serviço dá a entender que, caso os policiais cruzem com um grupo de brancos, não há perigo. Na manhã de hoje, ele pretende enviar um pedido de explicações ao governador Geraldo Alckmin e ao secretário da Segurança Pública, Fernando Grella. O DIÁRIO solicitou entrevista com o capitão Beneducci, sem sucesso. A reportagem também pediu outro ofício semelhante, em que o alvo das abordagens fosse um grupo de jovens brancos, mas não obteve resposta até o fim desta edição. Confira a íntegra da nota de esclarecimento enviada pelo Comando da Polícia Militar: A Polícia Militar lamenta que um grupo historicamente discriminado pela sociedade, que são os negros, seja usado para fazer sensacionalismo. O caso concreto trata de ordem escrita de uma autoridade policial militar, atendendo aos pedidos da comunidade local, no sentido de reforçar o policiamento com vistas a um grupo de criminosos, com características específicas, que por acaso era formado por negros e pardos. A ordem é clara quanto à referência a esse grupo: “focando abordagens a transeuntes e em veículos em atitude suspeita, especialmente indivíduos de cor parda e negra com idade aparentemente de 18 a 25 anos, os quais sempre estão em grupo de 3 a 5 indivíduos na prática de roubo a residência naquela localidade”. A ordem descreve ainda os locais (quatro ruas) e horário em que os crimes ocorrem. Logo, não há o que se falar em discriminação ou em atitude racista, tendo o capitão responsável emitido a ordem com base em indicadores concretos e reais. Discriminação e racismo é o fato de explorar essa situação de maneira irresponsável e fora de contextualização.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Rosamaria faz 70 anos

Conheço Rosamaria Araujo Nunes antes mesmo de nascer. Nove meses, para ser exato. Vivia eu da perambulagem, a esmo. Suscetível a ilações luxuriantes e permeável a descalabros pecaminosos. Sina da errática existência microgamética. A filha do contabilista Aufredi Nunes e da dona de casa Maria Ferreira de Araujo acolheu-me por 36 semanas. Tempo de vida mansa. Manhãs e tardes a fio a balouçar, de leste a oeste, em macias redes placentárias. Noites agradáveis, coberto por suaves lençóis amnióticos. Rosamaria sempre me pareceu personagem bíblica. Fez-se luz a pelo menos 4 pessoas. Incontáveis vezes separou as águas e abriu pedras para os filhos passarem. Acreditou e desacreditou tanto dos falsos quanto dos verdadeiros profetas. Por vezes foi negada e traída pelos pedros e judas desta vida afora e quieta ficou, sem comemorar, quando cada um destes em estátua de sal transformou-se. Amou com a mesma intensidade do vigor dos milagres, porque, avisara Paulo por intermédio dos Coríntios, desprovida do amor ela nada seria. Rosamaria presenciou, em três décadas como funcionária da Caixa Econômica Estadual do Rio Grande do Sul, os vendilhões a locupletarem-se à custa dos templos, cargos e dinheiro público. Nas madrugadas como enfermeira no Conceição, na zona norte de Porto Alegre, afeiçoou as provações de Jó em fé, cura e solidariedade aos enfermos e necessitados. A cada retorno ao pequeno apartamento em frente ao hospital multiplicava o café da manhã. Aos filhos destinava os escassos leite e pão, e a ela o café puro e força. Rosamaria também soube ser salomônica. Cansada do desgastante exercício diário da divisão dos peixes, resolveu-se pela diáspora filial para vencer a perseverante e corrosiva estiagem financeira e poupar o rebanho da dificuldade. Manteve ao lado a primogênita, Laura, e pôs os outros cada qual em um ninho. Fiquei em Livramento com minha avó, meu irmão André foi morar em Faxinal do Soturno, com o avô, e Rosana, a menor, aninhou-se nos braços da tia Lucila. Quatro anos depois Rosamaria reagruparia os rebentos, doravante afastada da indigesta sombra da penúria material. Agora, aos 10 anos, eu vislumbrava Rosamaria como uma figura histórica: Cleópatra. Desprovida, logicamente, daquelas riquezas, mas amparada pela pirâmide de livros disposta na cabeceira. Aquela construção literária no meio da cômoda à beira da cama a deixava portentosa, resplandecente e mais linda. Impressionante como o livro embeleza uma pessoa. A partir daí comecei a presenteá-la todo ano com aquele objeto retangular mágico. Mandei, inclusive, erguer uma pirâmide para ela só com a obra do Rubem Fonseca. Foi a glória. Passei então a ver Rosamaria como uma águia. Lá no topo das páginas, imponente e bela, atenta aos relatos das brisas e ao canto das rochas. Um farol no ponto mais alto do arco-íris, olhando em direção ao chão para não pisar nas pessoas e nem tropeçar em cordilheiras e vales. A rosa dos meus ventos. Por isso, Rosamaria Araujo Nunes, parabéns pelo dia de hoje. Por bem seres, bem saberes e principalmente por bem teres a nós como bens. Feliz aniversário, mãe. Porto Alegre, 22 de janeiro do ano 70 d.R.