terça-feira, 13 de maio de 2008

O panorama do jornalismo investigativo



Quatro visões internacionais sobre o jornalismo investigativo


Todos os participantes do III Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo puderam testemunhar, em encontro especial na noite de sexta-feira (09/05), quatro panoramas internacionais sobre o jornalismo investigativo. Rosental Calmon Alves, do Knight Center para Jornalismo nas Américas no Texas; Américo Martins, da BBC de Londres; José María Irujo, do El País; e Lise Olsen, do Houston Chronicle participaram do debate.
EUA I
Rosental fez uma breve explanação, enfocando sua área de estudo: o jornalismo digital. Mostrou um aspecto negativo, a crise sem precedentes no mercado americano, com grande queda de vendagens devido à internet, e outro positivo, o computador como instrumento de reportagem.
"O jornalismo americano não pode perder sua característica de buscar aquilo que os poderosos querem que ninguém saiba", afirmou. Como exemplo, citou a Pro Publica – agência de jornalismo investigativo que oferece, gratuitamente, conteúdo a publicações –, e a reação de grandes jornais. "Há quatro anos, o New York Times, que é o jornal menos afetado pela crise, abriria mão. Hoje, na própria matéria sobre a Pro Publica, eles disseram que considerariam o material".

Reino Unido
Américo iniciou sua palestra com uma máxima: a Inglaterra tem a melhor – "Financial Times, Economist e The Guardian" – e a pior imprensa do mundo – "o sensacionalista; não dá nem mais pra chamar de tablóide porque o Guardian e o Independent são tablóides, mas pagam por informação e achincalham pessoas em nome da investigação".
Sobre jornalismo investigativo, Américo disse que os ingleses têm a característica de fazer investigação em todas as mídias. "O Today Program, na BBC rádio, pauta toda a mídia. Eles são mestres em investigação na TV. O Panorama, da BBC, colocou um repórter para investigar racismo na polícia britânica por seis meses. Ele fez o curso de policial, e chegou a servir. Essa reportagem teve um ano e meio de preparação", contou.
Fora da BBC, Américo citou o Channel 4, que levou o último Bafta de current affairs, e muitas produtoras que realizam jornalismo investigativo, um mercado atuante no Reino Unidos. "A questão agora é a cobertura de terrorismo. É uma obsessão da mídia mundial, e há poucas fontes. E terrorismo não é um 'crime normal', não há interesse da polícia que isso seja difundido", comentou.

Espanha
Irujo fez o painel mais pessimista. "São poucos os jornalistas especializados em investigação, não mais que uma dúzia, e todos na mídia impressa. As empresas não investem porque não há rentabilidade. Vivemos uma avalanche de jornalismo declaratório. A investigação é um pássaro raro", lamentou.
O governo espanhol tem feito coletivas sem perguntas, o que demonstra um cenário político desfavorável à investigação. Os repórteres pouco se dedicam devido à falta de estrutura e incentivo, procedimentos de rotina e acomodação. "E não há nada mais patético do que jornalista acomodado".
O espanhol fez questão de ressaltar a ética em investigação jornalística: "Não podemos grampear telefones. Não podemos invadir propriedades. Não podemos aceitar dossiês preparados por outras pessoas. Sou contra o uso de câmeras ocultas. Não podemos cometer nenhum delito que torne o jornalismo ilegítimo e perverso".
Américo Martins comentou depois concordando com a fala de Irujo, mas não sendo totalmente contra câmeras ocultas. "O que a BBC faz é se perguntar se aquilo tem como ser feito de outra forma. No caso do repórter que investigava os policiais, não havia. E ele conseguiu imagens sensacionais. Acabou preso, mas a justiça o liberou porque considerou que o interesse público estava acima", observou.
Irujo se mostrou meio desencantado com a internet. "Ela pode acabar com o jornalismo investigativo. Mas eu ainda acho que vai sobreviver, e encontrar seu espaço", apostou.

EUA II
Lise Olsen, que também integra o Investigative Reporters and Editors (IRE), foi na direção contrária. Ela mostrou exemplos de sites que fazem e contribuem para o jornalismo investigativo. Um especial do Arizona Daily Star registra todas as pessoas que morrem tentando atravessar a fronteira entre Estados Unidos e México, com foto e perfil, criando um banco de dados sobre a região.
Citando uma experiência colaborativa, mostrou um especial feito no Houston Chronicle sobre a qualidade do ar na cidade, em que aparelhos de medição foram distribuídos aos leitores que completavam as informações em um site. "A internet foi uma sócia da investigação. Há bancos de dados, mapas de análises sociais e o trabalho com blogs".
Felicitando a Abraji pelo congresso, e ressaltando que o Brasil tem que ter um trabalho de liderança no jornalismo investigativo na América Latina, ela ressaltou que, há 15 anos, somente três países tinham uma lei de acesso às informações públicas. Hoje são 60.

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