sexta-feira, 25 de abril de 2008

Direto da Suécia


Cartas de Estocolmo


Por Sandra Paulsen



Por essas coincidências da vida, o assunto obrigatório do momento na Suécia inteira é o assassinato de Engla, uma menina de 10 anos de idade, desaparecida a 600 metros de casa, aonde chegaria em menos de 5 minutos pedalando sua bicicleta. Há duas semanas, no caminho de casa, Engla encontrou-se com Anders Eklund, criminoso já conhecido da polícia e cinco vezes condenado pela justiça por tentativas de estupro e outros abusos sexuais. Eklund é agora assassino confesso de Engla e de uma moça nos seus trinta anos, Pernilla, morta há oito anos no interior do país, caso este que até agora não tinha solução. Uma denúncia há dois anos havia apontado Eklund como possível assassino de Pernilla. Mas a polícia – não se sabe por que - nunca fez o teste de DNA sugerido. Se o tivesse realizado, provavelmente Engla estaria viva.


O possível erro policial, assim como as técnicas usadas nos interrogatórios, no caso Engla e em outros de crimes famosos, são agora tema obrigatório dos jornais e de programas de TV aqui.
Pensei no caso Isabella, é claro, que por sua vez traz à lembrança o caso Bobby, quando um menino de dez anos foi torturado e morto pela mãe e pelo companheiro desta, há um par de anos, perto de Gotemburgo.

Aparentemente, essas coisas horríveis ocorrem em qualquer lugar. Parece, no entanto, que é ainda mais difícil aceitá-las quando envolvem pessoas de posses, que tiveram acesso a educação, que não estão passando necessidades materiais, que contam com todas as oportunidades para levarem uma vida “normal”. Na sua maior parte, os casos aqui costumam envolver problemas psíquicos e doenças mentais.

É o que eu imagino que poderia explicar o caso Isabella. Não posso crer na maldade pela maldade. As pessoas envolvidas devem ter algum desequilíbrio psíquico, algum grave problema mental, alguma falha moral séria. E nesses casos, as técnicas para interrogar suspeitos parecem ter um papel-chave na solução dos crimes. A mãe de Bobby, por exemplo, decidiu desabafar e contar toda a história, depois de dias negando seu envolvimento. Segundo uma reportagem no jornal Svenska Dagbladet, a policial encarregada do interrogatório conta que se sentou ao lado dela, segurando suas mãos, enquanto escutava a confissão.

Na reportagem, destaco o comentário da policial quando diz que, independentemente do crime, ela jamais sente ódio do criminoso: “É preciso distinguir entre o crime, repugnante, e a pessoa que o cometeu, um ser humano em crise”. No caso de Engla, uma dupla de exímias interrogadoras não levou mais de uma hora para obter a confissão não só de um, mas de dois assassinatos.


Na TV, multiplicam-se as análises do comportamento do assassino confesso de Engla, das falhas da polícia e, especialmente, do sistema penal sueco que deixa solto um criminoso sexual em série. Pessoalmente, sempre achei um absurdo que um estupro, aqui, possa ser penalizado com apenas dois anos de cadeia, e que uma pessoa como Eklund possa andar solto por aí cometendo mais crimes hediondos. Mas isso é assunto para outro texto.

Só torço para que os assassinos de Isabella, quem quer que eles sejam, decidam confessar logo o seu crime. Quem sabe um par de policiais do sexo feminino, agindo com empatia, possa ajudar?
Todos nós sabemos, quando cometemos um erro, como uma confissão, um reconhecimento e um pedido de perdão aliviam a consciência e nos permitem seguir em frente. Espero que a confissão, no caso Isabella, venha logo, para acabar com o suplício. O dos criminosos, o da mãe da menina, e o de todos nós, incapazes de entender e aceitar o ocorrido.

Sandra Paulsen, casada, mãe de dois filhos, é baiana de Itabuna. Fez mestrado em Economia na UnB. Morou em Santiago do Chile nos anos 90. Vive há quase uma década em Estocolmo, onde concluiu doutorado em Economia Ambiental.

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